Colegas Radialistas, a Direção do Sindicato dos Radialistas do Estado do Rio Grande do Sul, informa que estamos chegando na data base da negociação da Conveção Coletiva de Trabalho CCT 2024/2025, desta forma, solicitamos recentemente, um estudo para o escritório jurídico da Castro, Osório, Pedrassani & Advogados Associados o qual estamos compartilhando abaixo com todos pois se trata de um estudo muito importante para nossa categoria.
Gostaria de pedir um minuto dos colegas para esta leitura, que certamente irá redefinir uma nova visão na profissão dos radialistas.
Abraço para todos e boa leitura.
Sem mais
Ricardo Malheiros
Presidente
O CONTRATO DE TRABALHO DO RADIALISTA E O DIREITO DE IMAGEM
1. A natureza e o histórico da legislação especial do radialista
A legislação especial que regulamenta a profissão de radialista é, sem dúvida, singular no ordenamento jurídico brasileiro. Sua principal característica distintiva é que a Lei 6615/78 prevê um sistema de remuneração para o profissional radialista baseado no pagamento por cada função exercida. A remuneração do radialista, portanto, não se dá simplesmente pelo emprego na radiodifusora, mas haverá de ser calculada, por expressa disposição da lei, com base em cada função que exerça dentro da empresa, prevendo um adicional que varia de 10 a 40% do salário para cada função acumulada:
Art 13 – Na hipótese de exercício de funções acumuladas dentro de um mesmo setor em que se desdobram as atividades mencionadas no art. 4º, será assegurado ao Radialista um adicional mínimo de:
I – 40% (quarenta por cento), pela função acumulada, tomando-se por base a função melhor remunerada, nas emissoras de potência igual ou superior a 10 (dez) quilowatts e, nas empresas equiparadas segundo o parágrafo único do art. 3º;
II – 20% (vinte por cento), pela função acumulada, tomando-se por base a função melhor remunerada, nas emissoras de potência inferior a 10 (dez) quilowatts e, superior a 1 (um) quilowatt;
III – 10% (dez por cento), pela função acumulada, tomando-se por base a função melhor remunerada, nas emissoras de potência igual ou inferior a 1 (um) quilowatt.
E o decreto 84.134, de 1979, que regulamentou a lei 6615, descrevia 94 funções, divididas dentro dos três grupos de atividades (administração, produção e técnica) e dos 16 setores que a lei estabelece.
Cristaliza o caráter singular dessa legislação, a disposição do artigo 14 da lei 6615, que diverge frontalmente do princípio geral de Direito de Trabalho expressado na Súmula 129 do TST:
Art 14 – Não será permitido, por força de um só contrato de trabalho, o exercício para diferentes setores, dentre os mencionados no art. 4º.
SÚMULA Nº 129 – CONTRATO DE TRABALHO. GRUPO ECONÔMICO: A prestação de serviços a mais de uma empresa do mesmo grupo econômico, durante a mesma jornada de trabalho, não caracteriza a coexistência de mais de um contrato de trabalho, salvo ajuste em contrário.
Diferentemente, portanto, dos contratos de trabalho ordinários, que englobam a prestação de serviços inclusive para mais de uma empresa, se dentro do mesmo grupo econômico, a legislação do radialista prevê a possibilidade de mais de um contrato de trabalho na prestação de serviços a uma só empresa. A legislação do radialista, também, se distingue da compreensão geral do § único do art. 456 da CLT, que obriga o trabalhador, por um só salário, a executar todas as atividades que a empresa lhe apontar, durante a jornada laboral, desde que compatíveis com sua situação pessoal.
O princípio informador fundamental desse singular sistema de remuneração em nosso ordenamento jurídico é que a complexidade tecnológica do setor de Comunicação demanda que o trabalhador não seja remunerado pelo simples acúmulo de tarefas, mas sim pelo conjunto das responsabilidades técnicas ou funcionais que lhe são atribuídas. Diferentes responsabilidades técnicas ou funcionais são agrupadas e tipificadas como uma função no decreto regulamentador e seu exercício pelo mesmo trabalhador dá vazão a acúmulos de remuneração ou mesmo a novos contratos de trabalho.
É claro que passados 35 anos da edição daqueles diplomas legais, o avanço tecnológico demandava uma atualização, um aprimoramento, que refletisse a nova situação advinda da revolução tecnológica microeletrônica, que impactou todos os ramos da produção, em especial a Comunicação.
Mas não houve tempo nem condições para um debate técnico aprofundado. A contrarreforma laboral de 2017, que tem na Lei 13.467 seu maior exemplo, buscou atingir, igualmente, o setor da Comunicação em sua especificidade. A Lei 13.424/17 introduz na Lei 6615 o conceito da “multifuncionalidade”, abrindo o caminho para o desmantelamento da regulamentação legal da profissão de radialista.
E na primeira semana de 2018, o Governo Michel Temer aproveitou a oportunidade para editar o Decreto 9329, alterando os termos do supracitado Dec. 84.134/79 e terminando de despedaçar a regulamentação legal existente.
O novo decreto, calcado nas alterações que a Lei 13424/17 trouxera na Lei 6615/78, reduziu de 94 funções para 25, ou seja, para cerca de um quarto do quadro anterior, não só eliminando algumas funções como criando novas que açambarcam num só tipo jurídico tarefas que se desdobravam em diversos outros na antiga regulamentação. A consequência do novo decreto é clara: as empresas ficam eximidas de pagar a maior parte dos acúmulos de funções que usualmente se davam no cotidiano da prestação de serviços. Os trabalhadores passaram a ganhar menos pelo mesmo trabalho de antes.
São tantos os abusos cometidos contra os direitos dos trabalhadores radialistas no texto do Dec. 9329 que um exame minimamente completo demandaria muito mais do que este artigo se propõe a fazer. Vamos, porém, selecionar alguns exemplos para demonstrar o que foi feito, com base na mudança trazida pela supracitada lei 13424/17.
Recordemos que a lei 6615 prevê três grupos de atividade (administração, produção e técnica) e que estes eram desdobrados em 16 setores e tipificados em 94 funções. No grupo Administração, havia 1 única função, que foi extinta, (rádio e tv fiscal) e substituída por outra, nova (controlador de operações), provavelmente para evitar que o novel decreto contrariasse a lei ao extinguir completamente algo expressamente previsto para a regulamentação. No grupo Produção, as 58 funções foram reduzidas para 14. E no grupo Técnica, das 35 funções sobraram 10.
O exame das alterações feitas demonstra que seu conteúdo foi muito mais longe do que a “atualização ocupacional” e a ” correção das defasagens” em face do avanço tecnológico que justificaram a alteração legislativa e o decreto que lhe seguiu.
Não há, por exemplo, nenhuma evolução tecnológica que justifique que as 7 funções de Locutor previstas no texto anterior do Decreto (Locutor anunciador; apresentador-animador; comentarista esportivo; locutor esportivo; noticiarista de rádio; noticiarista de televisão e entrevistador) sejam unificadas numa única função, Locutor Comunicador.
Esta fusão de funções é apenas a expressão concreta da aplicação ideológica do conceito de multifuncionalidade, trazido pela lei 13.424, para obrigar que o profissional radialista que antes apresentava um programa de notícias e depois comentava jogos de futebol e recebia por estas duas funções, agora continuará fazendo ambas, mas a empresa não precisará pagar o acúmulo de funções.
O inciso II introduzido no art. 4º da Lei 6615/78 pela lei 13.424, que já citamos acima, é a base para a extinção completa do setor de manutenção técnica, que previa 9 funções no antigo texto do decreto 84134. Mas ainda que pudesse ser invocado para descaracterizar como função de radialista as tarefas de mecânico, eletricista ou técnico de ar-condicionado, não há fundamento técnico para extinguir funções como técnico de áudio, de manutenção de rádio ou manutenção de televisão, eis que estas tarefas continuarão a ser exercidas, mas agora por alguém sem a proteção da legislação, e sem os acúmulos de função.
Não há dúvidas de que o Quadro Anexo das funções de radialista devia ser atualizado, em face do avanço tecnológico, com a extinção de algumas funções que efetivamente não mais existem (como operador de telecine ou encarregado de cinema) e a adaptação de outras que ainda existem, mas que agregaram conteúdo em face dos novos recursos digitais, como operador de máquina de caracteres.
Mas não é isto o que Dec.9329 faz. O avanço tecnológico foi apenas o pano de fundo para que o texto do decreto tente revogar os princípios da legislação do radialista. A tipificação de tantas funções no Quadro Anexo tem como fundamento que o trabalhador radialista é remunerado por responsabilidade técnica ou funcional e não pelo somatório simples de tarefas.
Ainda que a evolução tecnológica permita concentrar tarefas num só equipamento, nem sempre poderá descaracterizar como responsabilidades técnicas diferentes. Assim, a nova função de Editor de Mídia Audiovisual, introduzida pelo Dec. 9329, contraria o princípio básico da legislação, eis que exige do radialista que formate o programa por meio ” de imagem e de áudio”, e nenhuma nova tecnologia e nenhum novo equipamento podem fazer com que não sejam duas responsabilidades técnicas distintas: formatar o som e formatar a imagem. E isto obrigatoriamente demanda, pela lei 6615/78, remuneração por acúmulo de funções, não podendo estas tarefas serem reunidas numa só função.
Mas nem a lei 13424/17, muito menos o Dec. 9329/18, revogaram o sistema de remuneração por acúmulo de função, ou seja, remuneração por responsabilidade técnica atribuída. Os artigos 13 e 14 da Lei 6615/78 não foram alterados em nada. O mecanismo utilizado nessa contrarreforma de 2017/2018 foi o de manipular a descrição das funções na regulamentação de modo a aliviar a folha de pagamento das empresas.
Mesmo, portanto, que as alterações normativas da lei 13424 e do Dec. 9329/18 sejam tomadas como fato consumado, as novas situações oriundas das alterações na forma de prestar e organizar o trabalho nas empresas de radiodifusão deverão continuar a ser interpretadas dentro dos princípios norteadores, não alterados, da lei 6615/78.
A evolução da radiodifusão
O principal meio de comunicação dos brasileiros no início do século XX foi o rádio. Estreando em 1922 no Brasil, no centenário de independência do país, o radiodifusor logo se propagou como a maior fonte de notícias dos brasileiros, em especial nas décadas de 30 e 40, na Era Vargas, com a instituição de programas governamentais de notícias como A Voz do Brasil, até hoje em vigor.
Por trás deste programa diário, dentro de uma cabine em uma estação de rádio, ficava o radialista, levando a sua voz – e apenas a sua voz – para a casa de todos os brasileiros. Salvo se por algum motivo específico fosse fotografado e acaso esta imagem fosse veiculada por outro meio, como no jornal impresso ou, a partir da entrada do televisor, filmado, sequer se conheceria da imagem física do radialista. Uma figura simultaneamente pública, pela distinção de sua entonação característica, quanto oculta, por se desconhecer sua imagem. Sua voz era sua marca.
Mais tarde, surge a televisão, já no pós-segunda guerra mundial. A imagem passa a ser central na transmissão. Mesmo com o reinado da televisão, porém, o rádio nunca perdeu completamente sua importância.
Recentemente, entretanto, com o advento da internet altera-se o contexto desta profissão, em especial com as redes sociais. A rede mundial é hoje a mídia mais consumida no mundo, ultrapassando inclusive a televisão. Hoje, o radialista não apenas tem sua voz gravada, como a sua imagem também está sendo transmitida em tempo real em plataformas como YouTube, Facebook, Instagram, bem como no site da própria transmissora de rádio.
O programa de rádio não é mais transmitido apenas por ondas de radiodifusão, como também na internet. Esta migração não poderia ter outra finalidade: alcançar uma maior gama de ouvintes/consumidores e, por conseguinte, mais anunciantes; anunciantes estes que, agora, poderão inclusive escolher se querem anunciar apenas no rádio ou se também na internet, exigindo que o locutor apresente fisicamente o produto.
O que antes era apenas a voz, hoje é a voz e a imagem do radialista. Se antes pouco importava a vestimenta e a forma de se portar do locutor, agora se torna uma preocupação constante com a sua aparência e a gesticulação que terá de realizar, posto que terá de manter a atenção não apenas do ouvinte, como também do espectador.
São novas as exigências sobre a profissão, mas que mantém sua remuneração estática, sem qualquer previsão da devida indenização decorrente da exploração de sua imagem por outrem. Surge, portanto, o debate: deve o radialista ser remunerado também pelo uso de sua imagem na internet?
2. Do Direito à Indenização pelo Uso da Imagem: Direitos da Personalidade e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)
Todo ser humano é, por sua própria existência, titular de direitos de personalidade que tutelam os seus aspectos mais fundamentais, garantindo a própria essência da dignidade humana1.
É próprio do indivíduo a dotação de diversas características que o compõem de forma física, moral e intelectual. A honra, a intimidade, a privacidade e, em especial, a imagem, são, simultaneamente, direitos fundamentais e da personalidade do ser humano, visto que constituem o mínimo necessário ao próprio existir da psique do indivíduo.
Não se trata de o sujeito os possuir por ter um direito à personalidade, pelo contrário: o ser os possui porque estes bens jurídicos constituem o que lhe é mais caro, único e próprio, sendo absolutos, intransmissíveis, indisponíveis, irrenunciáveis, ilimitados, imprescritíveis e impenhoráveis, e, dentro de um limite, disponíveis2.
Apesar dos direitos de personalidade serem, por disposição do artigo 11 do Código Civil, intransmissíveis e indisponíveis, os aspectos patrimoniais podem ser destacados ou transmitidos, desde que de forma restrita. É o caso, por exemplo, da cessão gratuita do corpo após a morte, para fins científicos ou altruísticos, como rege o artigo 14, CC; a reprodução assistida por método de gestação de substituição, conforme art. 9º, da Lei 9.434/97, e Resolução CFM nº 2.320/22; do proveito do autor sobre suas obras, segundo arts. 28, 29 e 30, da Lei 9.610/98; a exploração de invenções, modelos e patentes desenvolvidas por empregados, consoante art. 90, da Lei nº 9.279/90; a possibilidade de o atleta explorar sua imagem por terceiros, conforme artigo 164, da Lei nº 14.597/23; dentre outros.
Portanto, é possível o exercício de expressão do direito à personalidade de alguém por outrem, desde que este uso seja para uma finalidade específica e temporária. Como estipula o Enunciado nº 4 do CJF/STJ: “o exercício dos direitos da personalidade pode sofrer limitação voluntária, desde que não seja permanente nem geral”. Especificamente no que tange ao direito de imagem, esta proteção conferida ao titular é referida no art. 5º, incisos V, X, XXVIII, “a”, da Constituição Federal, e os artigos 12 e 20, do Código Civil, definem:
Constituição Federal
Art. 5º (…)
V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
(…)
X – São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(…)
XXVIII – são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;
Código Civil
Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
(…)
Art. 20. Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.
No cotejo do exercício das profissões dentro de uma sociedade complexa, haverá justamente a disposição comercial destas habilidades, intelectuais ou físicas, que compõem a personalidade do ser. Modelos, ao desfilarem e permitirem a comercialização de suas fotografias, o fazem como um exercício da disposição patrimonial de seu direito de imagem, nos termos dos arts. 5º, incisos V, X, XXVIII, “a”, CF, e 12 e 20, CC, colacionados acima. Acaso não tivessem expressamente autorizado o uso comercial de sua imagem, poderiam exigir a proibição da circulação desta, bem como indenização correspondente.
Esta proteção à imagem abrange não apenas a efígie, a forma plástica da pessoa abrangida pela visão, como também a voz, a imagem sonora da fonografia e da radiodifusão, e os gestos. É a posição adotada por Pontes de Miranda e Walter Moraes, sendo que este último define3:
Toda expressão formal e sensível da personalidade de um homem é imagem para o Direito. A idéia de imagem não se restringe, portanto, à representação do aspecto visual da pessoa pela arte da pintura, da escultura, do desenho, da fotografia, da figuração caricata ou decorativa, da reprodução em manequins e máscaras. Compreende, além, a imagem sonora da fonografia e da radiodifusão, e os gestos, expressões dinâmicas da personalidade. A cinematografia e a televisão são formas de representação integral da figura humana. […] Também as partes destacadas do corpo, desde que por elas se possa reconhecer o indivíduo, são imagem na índole jurídica: certas pessoas ficam famosas por seus olhos, por seus gestos, mesmo pelos seus membros.
Tradicionalmente, os radialistas sempre dispuseram tão apenas de sua voz, sendo remunerados a tanto por meio de seu contrato de trabalho. Entretanto, com o surgimento da internet, também a sua imagem está sendo explorada pelas radiodifusoras, por meio de streamings, lives, programas que agora também possuem a gravação da imagem do locutor e que é disponibilizada nesta nova plataforma de mídia, de forma permanente. O que antes era etéreo passa a ser uma marca constante nas redes, sendo repetida à exaustão, para quantas vezes o usuário quiser.
Não cabe uma mera autorização genérica, como tampouco a presunção de que faz parte da prática usual da profissão. A disponibilidade dos direitos de personalidade sempre deverá ser tratada de forma restritiva, demandando autorização expressa do agente, conforme manda o artigo 20 do Código Civil.
E tratando a imagem de um dado pessoal do indivíduo, também a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) exige a expressa autorização do titular para a sua utilização por terceiros, especialmente para fins comerciais, como dita o art. 2º, IV, art. 5º, I e V, art. 6º, I, e art. 7º, I, da Lei nº 13.709/18:
Lei Geral de Proteção de Dados
Art. 2º A disciplina da proteção de dados pessoais tem como fundamentos:
(…)
IV – A inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem;
Art. 5º Para os fins desta Lei, considera-se:
I – Dado pessoal: informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável;
(…)
V – Titular: pessoa natural a quem se referem os dados pessoais que são objeto de tratamento;
Art. 6º As atividades de tratamento de dados pessoais deverão observar a boa-fé e os seguintes princípios:
I – Finalidade: realização do tratamento para propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados ao titular, sem possibilidade de tratamento posterior de forma incompatível com essas finalidades;
Art. 7º O tratamento de dados pessoais somente poderá ser realizado nas seguintes hipóteses:
I – Mediante o fornecimento de consentimento pelo titular;
Afinal, a autorização genérica, inclusive cedendo o uso por tempo indeterminado da imagem do radialista, configuraria uma renúncia à direito fundamental, o que é vedado pelo ordenamento jurídico. Por conseguinte, esta autorização seria absolutamente nula por ter um objeto ilícito – a renúncia a um direito fundamental -, nos termos do art. 166, inciso II, do Código Civil.
Ainda, a autorização do uso da imagem deverá conter expressa menção aos consectários patrimoniais ao seu titular, especialmente caso está seja veiculada para fins comerciais por aquele que dela se dispor.
Na esfera cível, o Superior Tribunal de Justiça já sedimentou entendimento de que o uso comercial não autorizado da imagem de alguém independe da prova do dano pelo seu titular, conforme Súmula 403:
Súmula 403 – STJ
Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.
Na esfera cível, portanto, se tem que o uso da imagem de alguém por terceiros para fins comerciais gera o dever de indenizar, uma vez que atinge os direitos de personalidade desta pessoa. Porém, não se pode escusar a relação de emprego estipulada entre o radialista e a rádio, bem como os termos que permeiam este contrato de trabalho.
Conclusão
O encontro da legislação especial profundamente singular do radialista com os princípios básicos do Direito à Imagem, tal qual entendido em nosso ordenamento jurídico, não pode levar a outra conclusão que não a obrigatoriedade de remunerar o profissional de rádio pelo uso de sua imagem na internet durante a transmissão de um programa radiofônico.
O tema é novo e ainda não foi devidamente enfrentado por nossos tribunais. Mesmo assim, recentemente, em março de 2024, o Tribunal Superior do Trabalho concedeu indenização pelo dano moral a uma vendedora que participava de leilões de jóias patrocinados por seu empregador num programa de televisão. Ainda que não seja um caso específico, o importante é verificar que nossa Corte Superior Trabalhista assevera a necessidade de haver autorização expressa para o uso comercial da imagem de um trabalhador, sendo ato ilícito da empresa o uso indevido da imagem daquele. (AIRR 168-24.2020.5.09.0002, em 20.03.24)
Vê-se, portanto, que a legislação trabalhista dialoga com a legislação civilista, posto que a imagem se trata de um direito fundamental à personalidade de qualquer ser humano. O seu uso por terceiros sempre demanda autorização clara, expressa, com prazo de vigência e dispondo sobre os direitos patrimoniais decorrentes deste uso, não sendo possível a autorização gratuita de forma genérica e permanente pela vedação à renúncia a direito fundamental.
Este acréscimo de remuneração, pois, pode ser incluído na Lei 6615/78, ou então negociado entre patrões e empregados nas convenções e acordos coletivos de trabalho. Se não for assim, passará a ser buscado na Justiça do Trabalho.
Porto Alegre/RS, 16 agosto de 2024
Antônio Escosteguy Castro Augusto Stürmer Caye
OAB/RS 14.433 OAB/RS 115.093