O QUE VOCÊ FEZ NOS ÚLTIMOS 100 DIAS?

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O QUE VOCÊ FEZ NOS ÚLTIMOS 100 DIAS?

O governo Lula fez muito em 100 dias, sob condições de ameaça constante. O Brasil voltou ao mundo como um parceiro a ser tratado com seriedade

Lula Marques/Agência Brasil.

O governo Lula fará 100 dias na próxima semana e a grande mídia, cada vez mais acomodada no seu velho papel, cobra sem parar novas medidas, criatividade e – o que é mais estarrecedor – crescimento a jato do PIB, baixa nas taxas de desemprego, redução do dólar, menos inflação, garantia de superavit primário.

Ora, considerando que os jornalistas da grande mídia não são um bando de primários incultos, sobra a opção de que seguem diretrizes emanadas dos seus empregadores. Isto posto, vamos ao que interessa.

Pensemos bem. Se cada ministro e ministra do governo Lula tivesse pegado uma vassoura e simplesmente se dedicado a varrer toda a imundície encontrada, já teria feito muito. Dificilmente, em 100 dias, eles conseguiriam cumprir esta missão, deixando a casa arrumada para começarem a trabalhar.

Mas eles fizeram muito mais do que isto. O governo Lula está estruturando uma nova e interessante forma de Estado, com muitos ministérios focados em problemas que merecem órgãos deste status, e isto não é pouca coisa. Em meio à arrumação, foi ainda necessário enfrentar as Forças Armadas, que dava guarida a acampamentos neofascistas nos portões de seus quartéis, e um golpe de estado que estava sendo arquitetado desde antes da posse.

A vitória de Lula no dia 31 de outubro de 2022 não garantia nada, estava armado um golpe que ultrapassava em muito os desvarios da turba das mídias sociais. Envolvia ex-ministros, servidores graduados das forças policiais militares, um tipo de empresariado milicianizado e uma turba de fanáticos que serviria como bucha de ganhão.

O governo Lula conseguiu sair ileso desta esbórnia, inclusive levando adiante as medidas legais necessárias para desvendar toda a trama e começar a punir quem deve ser punido. E fez muito mais.

Em 100 dias, o Brasil também voltou ao mundo como um parceiro a ser considerado com seriedade. O presidente foi à Argentina, ao Uruguai, aos Estados Unidos e, na semana que vem, irá à China. Enquanto isto, seu assessor especial, Celso Amorim, administra relações mais complexas, na Venezuela e na Rússia, deixadas em suas mãos com grande astúcia.

Internamente, o governo enfrentou com vontade política invejável a crise em Roraima, que envolve a sobrevivência de um de nossos povos indígenas, e o desmantelamento do criminoso garimpo de ouro.  O problema está longe de ser resolvido, mas os encaminhamentos são corretos.  Não menos importante e urgente foi a reorganização do programa Bolsa Família, que havia se tornado um ninho de malversação do dinheiro público a serviço da reeleição da extrema-direita nas últimas eleições. Foi relançado também a Minha Casa Minha Vida e o Ministério da Saúde reapareceu, saindo do fundo do poço em que havia submergido, sob o comando de um general falastrão. Temos campanha de vacinação, temos programa de aceleração de cirurgias eletivas. O Ministério da Cultura reorganiza-se, assim como o da Mulher e da Igualdade Racial e dos direitos Humanos.

Temos agora um governo e ministros que respondem à sociedade com a responsabilidade de seus cargos, estão sempre à disposição das TVs, dos jornais e mesmo da mídia alternativa para esclarecer, prestar contas. Mas a mídia quer coisas novas. Talvez esteja com saudade de algum ministro conversando com Cristo nos galhos de uma goiabeira… Seria uma novidade e tanto.

Deixando a estultice de lado, não falei de economia. Não sei se o arcabouço fiscal apresentado por Haddad é a melhor solução, nem mesmo se deveria haver um arcabouço fiscal.  Não tenho qualificações para falar no tema, mas sou muito mais simpática às posições da economista indiana Jayati Ghosh, que esteve no Brasil em um seminário promovido pelo BNDES, e de André Lara Resende, que deu um show de bom senso em uma entrevista na Globonews para Miriam Leitão. A certa altura, num lance de genialidade, ao ouvir da jornalista que todos os economistas eram contrários às ideias dele, responde: “Todos os que você lê!”.

Mesmo não entendendo do assunto, não sou simpática às soluções fiscalistas, mas compreendo a posição de Haddad. Ele enfrenta uma situação muito particular: o mercado tornou-se, na atual quadra da história do Brasil, uma instituição de Estado, que responde sob a alcunha de Banco Central independente.  BC independentes existem espalhados pelo mundo, mas imagino que poucos sejam dependentes de forma tão caricata do mercado e dos setores que viviam sob a proteção do governo derrotado como o brasileiro, o que torna a posição do Ministro da Fazenda complicadíssima. Isso me faz lembrar a posição de uma família que tem um membro sequestrado: quanto mais paga aos meliantes, mais dinheiro é exigido e o sequestrado não volta.

Para completar o quadro, também é preciso considerar o atual Congresso Nacional e, mais especificamente, a Câmara de Deputados, cuja maioria, sob o comando de Arthur Lira, não tem pudor, nenhum pudor de escancarar ao mundo que não tem qualquer preocupação com o país, apenas com seus mais inconfessáveis e corporativos interesses.  A massa dos deputados federais foi o que restou do desmonte da estrutura político-partidária levada a efeito a partir de 2013, pelo apetite do centro e da direita de acabar com o PT, uma conjunção de PSDB aético com um lavajatismo muito próximo de um conluio de feição mafiosa.  O país está pagando um preço muito alto por essa bizarrice irresponsável.

Portanto, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva fez muito em 100 dias, sob condições de ameaça constante. Tenho críticas? Certamente. Mas é hora de respirar fundo e afirmar sem medo que, apesar de todas as tempestades, a política voltou, o político voltou. E isto dá esperança de podermos colocar o país no rumo da normalidade democrática. Se, em 4 anos, o governo conseguir salvar o país da calamidade, que esteve no poder até 2022 e sempre está a rondar, estruturando um Brasil politicamente democrático e voltado para a resolução dos reais problemas das desigualdades de todas as ordens que nos afligem, viva o governo.

Céli Pinto Professora Emérita da UFRGS; Cientista Política; Professora convidada do PPG de História da UFRGS

fonte: sul21.com.br